Nos últimos dias ganharam as manchetes dos jornais, notícias de que a câmara aprovou a tramitação em regime de urgência de um projeto de lei que equipara o aborto ao crime de homicídio.
Trata-se do Projeto de Lei 1904, apresentado pela bancada conservadora. O projeto representa um retrocesso, transformando uma mulher vítima do crime de estupro, em uma criminosa ao abortar e a pune com uma pena de 6 a 20 anos, pena maior que a de um estuprador que hoje chega no máximo a 10 anos de reclusão.
Esse projeto demonstra que os conservadores não têm apreço pelo direito das mulheres, e isso não é novidade, mas o projeto de lei deixa mais do que claro, é um carimbo.
Projeto de lei 2.848/1940
Segundo a lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940, o aborto é considerado legal quando a gravidez for resultado de abuso sexual ou coloca em risco a saúde da mulher. O STF também estabeleceu em 2012 que é permitido interromper a gestação quando é detectado que o feto é anencéfalo, que é quando o bebê não possui cérebro, nestes casos o aborto é realizado pelo SUS (Sistema único de Saúde).
Machismo e pacto do patriarcado
Uma coisa é certa, se homens engravidassem, o aborto seria completamente acessível no Brasil. Mas não engravidamos e o pacto do patriarcado segue tratando as mulheres como seres inferiores, seres que não podem decidir sobre seus corpos, suas vidas. De tempos em tempos homens tentam cercear direitos conquistados por mulheres com muita luta, inclusive falas do ex-presidente da república, Jair Bolsonaro, que deixou bem claro que mulher deve ganhar salário menor porque engravida.
Aborto liberado
Israel, que é defendido ferozmente por conservadores brasileiros por ser um País mencionado na Bíblia, vai na contramão dos que defendem o conservadorismo. O aborto no País é bastante acessível, uma lei de 2022 ampliou os casos em que o aborto é liberado, nos seguintes casos:
Quando a gestante é menor de 18 anos;
Quando a pessoa gestante não é casada;
Quando a gravidez não é do casamento;
Quando a gestante tem 40 anos ou mais;
Quando a gravidez provém de relação incestuosa ou de estupro;
Quando o feto apresenta probabilidade de doenças;
Quando a gravidez coloca a vida da gestante em perigo ou causa danos físicos ou emocionais.
Isso demonstra que o poder público não pode colocar religião à frente de políticas de estado.
Saúde pública
Para além de convicções teológicas e religiosas, aborto legal é uma questão de saúde pública, mas infelizmente no Brasil a mulher é tratada como mero ser biológico reprodutivo. No Brasil uma a cada 7 mulheres internadas por complicações no aborto tem menos de 19 anos.
Segundo dados do ministério da saúde, 675 internações resultaram em óbito entre 2012 e 2023, mas acredita-se que estes números sejam muito maiores, considerando que muitas mulheres nem chegam aos hospitais e quando chegam dizem que foi um aborto espontâneo devido a criminalização no nosso País.
Resistência
Assim que a tramitação em regime de urgência do projeto do retrocesso foi aprovada, a resistência começou. Deputados federais contrários a este projeto e ministros como o dos Direitos Humanos fizeram discursos, movimentos de mulheres condenaram e passaram a se mobilizar para resistir. Não se falava em outro assunto em rodas de conversas, debates no cenário político, e as mulheres se organizaram e se mobilizaram realizando atos em diversos estados do País a fim de barrar esse projeto de lei.
Tiro pela culatra
O presidente da câmara, que está em campanha para eleger seu sucessor, aprovou em 23 segundos a tramitação de um projeto tão importante para as mulheres e para a sociedade, mas não imaginava que a maioria da sociedade seria contra e que as mulheres resistiriam bravamente.
A resistência veio de maneira firme, a OAB classificou o projeto como inconstitucional, não convencional e ilegal, pesquisas recém divulgadas como a da IPEC, apontam que a maioria dos brasileiros é favorável ao aborto nos casos previstos em lei, não restou outra maneira senão engavetar este projeto grosseiro, absurdo.
O presidente acuado convocou os líderes da câmara e em uma entrevista coletiva anunciando o arquivamento deste projeto. Infelizmente não se pode baixar a guarda, os conservadores vão esperar a poeira baixar para tentar novamente empurrar goela abaixo da sociedade e sem devida discussão esse projeto retrógrado.
Texto escrito por Ivo Mendes
É ativista e militante há mais de 12 anos em pautas antirracistas e no combate às desigualdades sociais no Brasil. Retirou o medo do seu vocabulário, por isso é um sonhador por essência e entusiasta por sobrevivência. Formado em Gestão da Tecnologia da Informação, passou pela vida política da Baixada Santista e atualmente trabalha na área administrativa e integra a equipe de colunistas do Portal Águia.
Revisão por Eliane Gomes
Edição por Felipe Bonsanto
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